quinta-feira, 23 de setembro de 2010

TOCAVA QUE NEM UM DEMÔNIO

Robert Johnson


Talvez o nome mais misterioso entre os mestres do blues. Viveu apenas 27 anos, não se sabe exatamente quando nasceu e como adquiriu tanto talento em tão pouco tempo, gravou apenas 29 músicas em 2 anos (1936 – 1937), foram 41 faixas mas 13 foram gravadas duas vezes, é difícil de entender como as gravações ficaram boas com um violão Kokomo bem barato e de caixa pequena, não se sabe o que realmente o matou e mesmo depois de morto conseguiu a façanha de vender 500.000 cópias de suas gravações relançadas em 1990 (disco de ouro) e ainda ganhar um Grammy, mas o maior mistério é sobre a lenda de seu encontro com o Diabo em uma encruzilhada, onde teria vendido a alma em troca de ser o maior dos bluesmen.

É possível tentar entender alguns destes mistérios. Robert era filho de Julia Dodds casada com seu padrasto Charles Dodds, mas seu verdadeiro pai era Noah Johnson, este sobrenome ele assumiu depois, nasceu no Mississippi em 1911 ou 1910, a data precisa é desconhecida, e trabalhou no campo até os 16 anos, quando resolveu seguir carreira artística tocando gaita e violão em qualquer lugar, principalmente na rua, mas em vida não conseguiu nenhum sucesso comercial.
Johnson começou a aprender guitarra com seu irmão mais velho Charles, e ter perambulado por muitos lugares e ter ouvido e conversado com muitos artistas em sua região, deve ter sido o aprimoramento de seu conhecimento musical. Foi influenciado por Charley Patton, Son House e Willie Brown de onde vieram seus slides, escutou os primeiros pianistas de Boogie-Woogie e aprendeu a usar notas graves, com Lonnie Johnson aprendeu a estrutura musical e disto tudo, mais seu talento natural, ele criou o seu próprio blues. Alguns salientam que as fotos que existem de Johnson mostram que ele tinha mãos bem grandes e que isto lhe proporcionava fazer acrobacias no braço da guitarra que são muito difíceis para outras pessoas com mãos normais.

As suas 41 faixas foram gravadas em 3 lugares diferentes: uma sessão de gravação em San Antonio, Texas, em Novembro de 1936, em um quarto de hotel durante 3 dias ele gravou 16 músicas, entre elas as duas versões de Crossroads que foi composta a caminho do local; uma segunda sessão em Dallas, Texas, em Junho de 1937 em um depósito; e a gravação de uma música (Kind Hearted Woman) feita em uma rádio.

A lenda sobre seu talento ter vindo de uma troca com o Chifrudo surgiu por vários motivos e tem até local definido, a encruzilhada das rodovias 61 e 49 em Clarksdale, Mississipi. 


Monumento em Clarksdale próximo a encruzilhada 61 com 49

Essa lenda foi difundida inicialmente por Son House e ganhou força devido a algumas de suas músicas – Crossroads Blues (Blues da encruzilhada), Hellhound On My Trail (Cão do inferno no meu encalso), Me And The Devil Blues (Blues de mim e o Diabo) – além de ter surgido do nada tocando daquela maneira diferente e levar uma vida desregrada. Son House havia encontrado Johnson em 1931 e depois somente em 1933 quando ficou surpreso com o seu talento – o que indica que ele teria se tornado um mestre em apenas 2 anos – ajudando a difundir seu talento entre os bluesmen da região, onde se tornou respeitado como músico e chamado ainda em vida de The King of the Delta Blues Singers.

Sobre a sua morte existem várias teorias. Teria morrido de sífilis, ou por tiro de arma de fogo, ou por facada, ou envenenado. O fato é que tudo ocorreu em 1938 durante uma apresentação no bar Tree Forks em Grewwood, Mississippi. Johnson bebeu whisky, passou mal e morreu 3 dias depois em 16/08/1938 na mesma cidade, no atestado de óbito aparecia apenas No Doctor (Sem Médico) como causa da morte. O whisky estaria envenenado com estricnina, supostamente preparado pelo dono do bar, o qual estava enciumado por Jonhson ter flertado com sua mulher, Sonny Boy Williamson que estava tocando junto com Jonhson, o havia alertado sobre o whisky, porém este não lhe deu atenção. Não existe prova de nada disto o que aumenta a especulação de que o Cramulhão tenha simplesmente cobrado a alma prometida depois de cumprido o combinado.

Ele continua influenciando e sendo lembrado por diversos artistas, como Muddy Watters, Eric Clapton, The Rolling Stones, Led Zeppelin, The Who, The Blues Brothers, Red Hot Chili Peppers, Yardbirds, Cream e The White Stripes entre tantos outros. Se ele está em cima ou em baixo? Não dá pra saber. O que aconteceu de verdade? Nunca saberemos. Vale a pena tentar um trato com o Cão? Sai fora, eu tenho medo! Só sei que dizem que ele tocava que nem um demônio.

O PAI DO ROCK

Quando escuto Chuck Berry logo me vem à memória tudo o que este cara representa para o rock n’ roll. Enquanto o Elvis é chamado de rei, Chuck Berry é chamado de Pai do Rock, justíssimo... ou nem tanto. Talvez se ele fosse branco Elvis tivesse que dividir o seu espaço exclusivo, conquistado com merecimento no coração de fãs e na memória de todos como uma celebridade inesquecível, todo mundo já ouviu falar em ELVIS PRESLEY, já o nome de Chuck Berry tem que ser explicado para quem não conhece o rock, mas esta conversa de “se isto ou se aquilo” não vem ao caso.

Ser o pai do rock significa que não importa ser o primeiro, o maior, o original, o melhor, etc., significa que sem ele o rock não seria como é ou teria demorado mais para ser como é, se diz que “não basta ser pai, tem que participar” e Chuck participou da criação do rock n’ roll mais que qualquer outro em sua época. Seus méritos são muitos, ele inventou o formato de banda de rock que é usado até hoje, fez o primeiro álbum misturando blues e country, fez o primeiro grande riff de guitarra (Johnny B. Goode), enquanto os músicos de sua época interpretavam as canções de outros ele compunha as próprias músicas e isto fez dele um dos mais gravados por outros artistas (Animals, Elvis Presley, Jerry Lee Lewis, Rolling Stones, The Beatles...), fazia danças engraçadas enquanto tocava guitarra, enfim, coisas que hoje são corriqueiras e quase que obrigatórias no rock tem o DNA do Pai, e todos que olhavam para ele pensavam, este é o caminho.


Este ano (2010) eu pude ver pessoalmente um show do Chuck aqui em Porto Alegre, ele tinha vindo aqui nos dois anos anteriores e não pude ir, achei que tinha perdido a maior chance e dificilmente veria ao vivo o último grande mosntro do rock dos anos 50, mas desta vez não perdi, e lá estava ele, velhinho, magrinho, com uma jaqueta de lantejoulas azul e seu cap branco de marinheiro, tocando sua guitarra semi-acústica e fazendo piadinhas para o público, sem telões, sem fogos, sem lasers, nenhuma parafernália para desviar a atenção do que interessava, um artista autêntico que mesmo com 83 anos parece ter sweet little sixteen, uma emoção inesplicável.

Que viva mais 100 anos fazendo rock n’ roll Charles Edward Anderson Berry, meu chará.




segunda-feira, 12 de abril de 2010

UM GRANDE DIA NO HARLEN

Quem já viu o filme O Terminal, dirigido por Steven Spielberg, em que um estrangeiro interpretado por Tom Hanks fica preso em um aeroporto por problemas de documentação, não podendo entrar nos EUA e nem voltar para o seu país, a fictícia Krakozhia, que está em meio a uma revolução, deve lembrar que o objetivo do personagem era conseguir completar uma coleção de autógrafos de grandes nomes do jazz que aparecem em uma foto velha. A coleção foi iniciada por seu pai que durante muitos anos buscou cada um dos músicos que aparecem nesta foto, mas morreu antes de completar todos. Na tentativa de realizar o sonho do pai, Viktor Navorski vem do leste europeu para procurar o último músico que falta, Benny Golson.


Pois bem, a história e o personagem são fictícios, embora exista um caso parecido de um iraniano que ficou preso em um aeroporto na França, mas a tal foto é bem verdadeira, e para os fanáticos por jazz ela é um objeto de veneração, pois nela estão reunidos 57 grandes nomes do estilo em um único click. O grande feito foi do fotógrafo Art Kane em uma rua do Harlen no ano de 1958 e é conhecida como “Um grande dia no Harlen”. Ali estão, entre outros, Benny Golson, Charles Mingus, Sonny Rollins, Thelonius Monk, Gerry Mulligan e sentado na calçada ao lado das crianças, o grande Count Basie. Aí está a foto, dá um belo poster e uma ótima história pra contar ouvindo jazz.